Ceará

A coragem de Pâmella de Holanda é rara. A monstruosidade do DJ Ivis, não

 Vídeos de DJ Ivis dando socos e chutes na esposa são divulgados em rede social

Não consegui ver todos os vídeos das agressões do tal DJ Ivis contra sua agora ex-esposa – socos, chutes e pontapés na presença da filha, um bebê de nove meses.

Primeiro considerei uma obrigação assistir às imagens até o final para opinar aqui sobre o assunto, mas concluí em seguida que todos nós já conhecemos bem a monstruosidade dessas cenas que se repetem a cada minuto no Brasil e no mundo. Aconselho às mulheres que, se puderem, evitem. Vinte segundos foram suficientes pra me causarem um sentimento do qual ainda não sei como me livrar – talvez escrevendo.

Embora chocantes, as agressões brutais do DJ e produtor musical contra Pâmela de Holanda não são as primeiras que chegam à grande mídia – dentre as tantas que acontecem entre quatro paredes e ninguém desconfia de nada.

Quem conseguiu esquecer o caso do também músico Victor, da dupla Victor e Leo, que chutou a barriga da esposa grávida? As imagens viralizaram e ele ainda fez piada na internet. Sim, piada. E não deu em nada. Nunca foi preso.

A verdade é que a dita moral conservadora, aquela hipocritamente idolatrada pela família tradicional brasileira, tem um nível de tolerância absurdamente alto a esse tipo de barbárie.

Não seria exagero dizer que, nas famílias tradicionais, poucas coisas são tão comuns quanto agressões contra mulheres  que são silenciadas e ameaçadas a vida inteira e jamais denunciam.

No Brasil, a mulher que escolhe denunciar um agressor precisa estar preparada pra provar que de fato foi agredida, que não é uma interesseira chantagista,  e, por fim, que não mereceu apanhar.

Depois da agressão, ela enfrenta uma série de agressões (institucionais) pra tentar frear as agressões – um paradoxo ainda mais brutal do que aquelas imagens que eu precisei evitar.

Por isso a coragem de Pâmella é tão inspiradora: denunciar, no Brasil, é quase um ato de heroísmo, e a história de silenciamento dessa mulher se parece com muitas outras que tantas de nós já conhecemos ou presenciamos.

“Eu me calei por muito tempo! Eu sofria com minha filha, sem apoio até dos que diziam estar ali pra ajudar, que eram coniventes e presenciavam tudo calados sem interferir com a desculpa que eu tinha que aguentar calada porque era o ‘jeito dele’, era esse o ‘temperamento dele’ e que se eu quisesse viver com ele, teria que me sujeitar e ser submissa. Não se calem!!! Não se calem jamais!!! Eu não vou me calar!”, escreveu no Instagram, a mesma rede que usou astutamente para fazer uma denúncia irrefutável até mesmo por um sistema judiciário que coloca as vítimas na posição de investigadas.

Usar as redes sociais com inteligência para denunciar violência doméstica é uma resposta aceitável a esse judiciário macho que sempre dá um jeito de culpar a vítima. Imagina quantos poderosos perderiam suas máscaras (seus empregos e, com sorte, sua liberdade) se virasse tendência postar vídeo de agressão no Instagram?

E mesmo diante das imagens – provas incontestáveis – O DJ Ivis postou um vídeo de acusações à sua vítima.

“Eu era ofendido e agredido tendo que aguentar calado, sofri ameaças de morte”, diz o homem flagrado espancando a esposa em imagens virais.

Numa sociedade que permite que homens como Victor estejam impunes, homens como Ivis se sentem no direito de se reclamarem vítimas mesmo havendo  provas cabais de que são agressores monstruosos. Eles sabem que, quando a poeira baixar, eles serão perdoados: é assim que o ciclo da violência de gênero se perpetua.

Para além disso, as palavras deste homem não merecem nenhum outro contra-argumento. É a voz de Pâmella que devemos ouvir agora, e espero que sua coragem inspire mulheres que estão sendo agredidas neste momento.

Em um país como o Brasil – cuja “moral conservadora” admite espancar mulheres (inclusive grávidas e lactantes), sair da inércia e denunciar a violência doméstica exige, no mínimo, muita coragem.

A coragem de Pâmella de Holanda é rara. A monstruosidade do DJ Ivis, não
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