Não faltam mitos, lendas e superstições em que a Lua é um elemento importante – das fases supostamente melhores para se cortar o cabelo aos causos de lobisomem que surgem na noite de Lua cheia.
Alguns impactos do satélite, porém, são bem reais: um estudo constatou que a luminosidade variável ao longo do ciclo lunar realmente impacta o comportamento de mamíferos de florestas tropicais (ainda que não os faça morder ninguém).
A pesquisa foi feita com base em fotografias tiradas automaticamente por câmeras de vida selvagem instaladas em florestas tropicais da América Latina, da África e da Ásia. Essas máquinas são acionadas automaticamente quando um bichinho se aproxima.
Os pesquisadores utilizaram 2,1 milhões de cliques tirados entre 2008 e 2017, abrangendo 86 espécies de mamíferos. Os resultados foram publicados na última quarta-feira (16) na revista Proceedings of the Royal Society B.
A base de dados enorme permitiu dividir os animais entre fases do dia de maior atividade para cada um, e revelou minúcias interessantes: mesmo entre os animais noturnos, existem alguns que gostam da luz do luar e alguns que a evitam. Por isso, a dinâmica do bioma como um todo varia bastante ao longo do mês.
Das 86 espécies observadas, 12 decididamente evitavam a luz da Lua, enquanto três tinham maior probabilidade de emergir em condições de luar. Esses comportamentos podem estar intimamente ligados aos hábitos alimentares das espécies e ao fato de serem predadoras ou presas.
Qualquer que seja o animal, sair à noite envolve um conjunto de cálculos estratégicos. “Imagine brincar de esconde-esconde em um quarto escuro e alguém acender uma vela”, disse, em comunicado, Richard Bischof, professor da Universidade Norueguesa de Ciências da Vida (NMBU) e primeiro autor do artigo.
“A luz, mesmo que seja fraca, pode facilitar a sua orientação na sala. Mas se for você quem está se escondendo, de repente será muito mais fácil te detectar.”
Os resultados apontam que mesmo mudanças sutis na luminosidade da floresta impactam o comportamento dos animais, inclusive os que vivem em arbustos ou áreas de mata fechada que tipicamente são mais escuras.
Para os cientistas, isso gera preocupações sobre o impacto que a luminosidade artificial, produzida pelas intervenções humanas, pode causar nos ecossistemas florestais.
Eles explicam que, como resultado, alguns animais podem perder oportunidades essenciais de obter alimentos ou de se locomoverem e migrarem na floresta. Embora algumas espécies possam se adaptar melhor a noites mais claras, muitas outras – e até mesmo comunidades ecológicas inteiras – podem sair perdendo.
Esse é mais um aspecto negativo do desmatamento para a fauna de um lugar: deixar mais luz entrar. Essa mudança de iluminação se soma aos impactos da perda de mata nativa no solo, na água e no ar. “Essa pesquisa tem implicações sobre como a degradação do habitat pode afetar alguns animais tropicais”, disse Beaudrot.
As câmeras fazem parte de uma rede de monitoramento internacional chamada Tropical Ecology & Assessment and Monitoring Network (TEAM, na sigla em inglês). A coleta de imagens e dados nessa rede é padronizada, o que facilita o acesso e as comparações entre biomas.
No Brasil, existem 60 câmeras na Floresta Nacional de Caxiuanã, no Pará, e 90 espalhadas em reservas no Amazonas, poucos quilômetros a norte de Manaus.
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