Econômia

Setor de seguros avança com personalização, confiança e concorrência maior | Revista Valor Financeiro, Seguros e Previdência

  Oliveira, da CNseg: aumentou a percepção da sociedade sobre a necessidade do seguro — Foto: Sergio Ricardo/Divulgação

O mercado de seguros está entre os que exibem crescimento constante e expressivo nos últimos anos. Em 2024, a expansão nominal de 12,2% na arrecadação, de R$ 751,3 bilhões, superou a de sinistros, com alta de 7,8%, e veio diversificada pelos vários ramos dessa indústria que promete, para 2025, desempenho semelhante, com alta de dois dígitos. Produtos tradicionais, como os de vida, residencial e veículos, ganharam mais adeptos entre os brasileiros, estimulados tanto pelo aumento da renda média real no ano passado, a maior desde 2012, quanto pela estratégia das seguradoras de oferecer produtos personalizados, criados sob medida para atender demandas específicas dos clientes. As boas notícias incluem a reforma do setor, composta pelo Novo Marco Legal (Lei nº 15.040) sancionado no fim de 2024, garantindo mais confiança nas contratações, aumentando a transparência e a proteção dos consumidores, e pela entrada de novos participantes – cooperativas e associações de proteção veicular (Lei Complementar 213) –, que ampliará a concorrência e a oferta de produtos.

“É a maior reforma legal do setor de seguros dos últimos 60 anos. O importante é trazer o máximo de concorrentes para ofertarem produtos que sejam os mais confiáveis possíveis”, diz Alessandro Octaviani, titular da Superintendência de Seguros Privados (Susep). O mercado também comemora os números de 2024, ano em que o segmento de danos cresceu 11,5% em relação a 2023, e o de pessoas, 16,1%, incluindo o seguro de vida, com alta de 12,6%, conforme dados da Susep. “O ano foi muito positivo para a indústria. A sociedade aumentou a percepção da necessidade do seguro, tanto pelos efeitos da pandemia quanto pelos eventos climáticos e pela conjuntura econômica favorável, somada às ações das seguradoras de diversificação de produtos, de linhas de atuação e de canais, além da entrada de empresas no mercado e do aumento da digitalização”, diz Dyogo de Oliveira, presidente da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg).

O cenário para 2025 permanece promissor, com projeção de alta de 10%, estimada com base no avanço da diversificação de produtos, redução de custos e digitalização. Para danos e responsabilidades, a CNseg trabalha com expansão de 8%, para o grupo de pessoas com 9,5% e para o de saúde com 10,9%. “O trabalho do setor hoje é no sentido de agregar valor aos produtos. Um seguro de auto vem com chaveiro, reboque, troca de pneus. O seguro de vida vem com assistência para saúde e até oferta de academia”, diz Oliveira. Nos primeiros quatro meses, o setor supervisionado pela Susep arrecadou R$ 140,72 bilhões, o que representa crescimento nominal de 1,42% em relação ao mesmo período de 2024. Já o segmento exclusivo de seguros (excluindo VGBL, produto de previdência complementar aberta) cresceu 8,97%, em termos nominais. Dentro desse grupo, a expansão do ramo danos atingiu 8,96%; a de automóveis, 6,16%; a de pessoas, 8,99%; e a do seguro de vida, 9,92%.

O quadro positivo, no entanto, enfrenta desafios. Um deles, e mais recente, veio, em 11 de junho, com a alteração na incidência de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nos planos de seguros de vida com cobertura por sobrevivência (VGBL), estabelecida pelo Decreto nº 12.466. De acordo com a CNseg, a incidência de IOF, nos termos do novo decreto, elevará o custo tributário efetivamente cobrado sobre rendimentos para 44%, iniciando em 79% nos dois primeiros anos. A posição da entidade é de que a nova norma, que tenta “atingir a parcela da população classificada como ‘super-ricos’, vai impactar o principal instrumento de proteção previdenciária da classe média – o VGBL. Nos últimos cinco anos, o segmento de previdência privada cresceu constantemente, fechando 2024 com arrecadação de R$ 194,3 bilhões, 15,6% a mais que em 2023 (R$ 168 bilhões).

Outro desafio é a tímida participação do setor na economia nacional, que se mantém em torno de modestos 3,7% do Produto Interno Bruto (PIB) já há alguns anos (6,2% do PIB, considerando a saúde suplementar). “Apesar de o setor crescer a dois dígitos por vários anos, a representatividade é baixa quando se compara à de países desenvolvidos”, diz Rodrigo Tabarez, sócio-líder de seguros da Deloitte. Nos Estados Unidos, a indústria seguradora equivale a 15% do PIB, na França e Itália gira em torno de 12% e 13%. Segundo ele, embora as comparações ocorram entre países de diferentes níveis de desenvolvimento, a relação sinaliza para o potencial de crescimento.

O grande trabalho da indústria de seguros atual, no entanto, é ampliar a proteção ao campo. Hoje, o seguro rural, principal proteção para pequenos e médios produtores, abrange cerca de 7,6% da área plantada – nos Estados Unidos, a área segurada atinge 95% do total – e os prêmios cresceram apenas 1,5% no ano passado, pouco tanto em relação ao desempenho do mercado quanto à sua relevância para a economia brasileira, já que o agronegócio responde por 23,2% do PIB do país. “O Brasil é um importante pilar de segurança alimentar para o mundo e o agronegócio é uma indústria a céu aberto. Diante de tantas mudanças climáticas, isso é um tema que as seguradoras terão que se debruçar e terá que haver políticas públicas”, diz Gaya Schneider, sócia do escritório Ernesto Borges Advogados e presidente da Comissão Nacional de Direito Securitário da OAB Federal, citando o exemplo da recente ocorrência de gripe aviária no Sul, que ocasionou perdas expressivas.

Octaviani, da Susep: marco legal é a maior  reforma dos últimos 60 anos — Foto: Gabriel Reis/Valor
Octaviani, da Susep: marco legal é a maior reforma dos últimos 60 anos — Foto: Gabriel Reis/Valor

As transformações em curso mudaram a configuração de riscos globais, exigindo novos produtos capazes de atender às demandas por novos tipos de cobertura. É o caso do clima e dos riscos cibernéticos, que têm levado a mudanças e inovações nos seguros ofertados. Para reduzir os impactos sobre a rentabilidade, o setor tem investido em tecnologia e inteligência artificial a fim de aprimorar modelos de mensuração de risco, cada vez mais necessários diante das mudanças climáticas. O país, até então distante do mapa mundial de desastres climáticos, entrou para o grupo de risco após as enchentes no Sul, em 2024, onde apenas 7% das perdas estavam seguradas. Para enfrentar tal desafio, Octaviani defende a consolidação da cultura securitária na sociedade e o aprimoramento de tecnologias de prevenção de desastres, além de debates para definir o que cabe ao mercado segurador e ao poder público, que atuaria por meio da criação de fundos, como ocorre nos demais países.

A AXA, seguradora com atuação global e sede em Paris, tem focado no tema, atuando, também, na prevenção a partir da tecnologia e inteligência de dados. “Temos investido em geolocalização dos nossos riscos e no uso de dados para aprimorar nossos modelos de preços e de aceitação de riscos”, diz Arthur Mitke, vice-presidente de subscrição e sinistros da AXA. O mais recente produto, o seguro agrícola, foi lançado em junho, com tecnologia embarcada para proteger o produtor rural de eventos climáticos extremos. A cobertura inclui monitoramento via satélite capaz de identificar a evolução das lavouras, contribuindo na antecipação de riscos a partir das imagens e do uso de dados históricos. “Conseguimos visualizar situações em que poderão ocorrer seca. Nesse caso, vamos trabalhar com os produtores sinalizando esses riscos e sugerindo ações relacionadas à irrigação para evitar os impactos”, diz.

Além de atuar na prevenção, a seguradora também investiu nos momentos em que ocorrem os sinistros, estruturando protocolo de catástrofe que define ações a serem adotadas. Nosso protocolo de catástrofe tem assistência psicológica. “Usamos geolocalização para identificar os riscos localizados no mapa, com isso conseguimos mobilizar nossa equipe de atendimento. Sabemos os locais atingidos e onde estão os nossos riscos para colocar as bases de atendimento próximas aos segurados”, diz Mitke.

Schneider, da  Comissão Nacional de Direito Securitário da OAB: “Terá que haver políticas públicas” — Foto: Divulgação
Schneider, da Comissão Nacional de Direito Securitário da OAB: “Terá que haver políticas públicas” — Foto: Divulgação

As enchentes do Rio Grande do Sul mudaram a perspectiva do setor de seguros internacional em relação ao Brasil, na avaliação de Beatriz Protásio, CEO de resseguros da Aon. Na prática, significa mudança na avaliação de risco, exposição, precificação, de capacidade – o risco que as seguradoras querem reter e transferir – e a oferta de produtos, a fim de reduzir a lacuna entre perdas econômicas e perdas seguradas. “Na América Latina essa lacuna é muito maior do que no mundo. A cada US$ 100 de perda econômica, há entre US$ 20 e US$ 10 de perda segurada, mas vejo a indústria de seguros comprometida em buscar soluções para reduzir essa lacuna”, diz Protásio. As perdas estimadas com desastres naturais no Brasil resultaram em mais de US$ 12 bilhões em prejuízo em 2024, segundo relatório da Aon. Para a executiva, o seguro paramétrico está entre as soluções capazes de reduzir a lacuna atual. “A indenização ocorre de forma rápida e transparente e há menos pressão sobre os governos. É uma alternativa saudável para mitigar e responder rapidamente, como demonstra nosso histórico. Vemos o mercado aberto, mas ainda não na velocidade que gostaríamos”, diz. Um dos entraves em relação ao avanço dos modelos preditivos de catástrofes, a seu ver, está na dificuldade de coleta de dados históricos, com os detalhes necessários para gerar modelos consistentes.

Ivan Gontijo, presidente do Grupo Bradesco Seguros, concorda que a intensificação das mudanças climáticas, com aumento da frequência e da gravidade de eventos extremos, impõe ao setor segurador um papel cada vez mais estratégico. A experiência do Rio Grande do Sul, segundo ele, deixou clara a necessidade de fortalecimento do seguro rural e do desenvolvimento de soluções adequadas aos novos riscos, mas algumas mudanças já foram vistas: os prêmios relativos a equipamentos agrícolas na seguradora cresceram 13,3% no ano passado. “Desenvolvemos soluções buscando prospectar e nos antecipar ao surgimento de novos riscos”, diz o presidente da Bradesco Seguros, grupo que fechou 2024 com lucro líquido de R$ 9,1 bilhões, o maior de sua história.

As recentes catástrofes levaram a um aumento de preços que ocorreu em paralelo ao crescimento orgânico do mercado, segundo Antônio Jorge Rodrigues, chefe de resseguros da Howden Re. A questão climática, acredita, será um dos impulsionadores não apenas da expansão do setor, como também da base de dados e da informação. “Isso é algo em que o nosso mercado ainda é pobre. Devido ao aumento da competição, os resseguradores nunca foram tão incisivos no sentido da melhora da informação das carteiras das seguradoras para eles, sobre onde estão os riscos”, diz Rodrigues.

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