BRASÍLIA – A Câmara dos Deputados aprovou nesta segunda-feira, 21, por 258 votos a 136, o texto-base da medida provisória que viabiliza a privatização da Eletrobrás, estatal com foco em geração e transmissão de energia.
Em votação em separado, os deputados rejeitaram, por 394 a dois, as sete emendas propostas pelos senadores e que foram excluídas por Nascimento. Depois, analisaram os chamados destaques, que tinham por objetivo modificar o conteúdo da MP. Concluída a votação, o texto vai agora à sanção presidencial.
Com o aval do Congresso, o governo poderá dar prosseguimento aos preparativos para emissão de novas ações da empresa, prevista para o primeiro trimestre de 2022, por meio da qual a União vai reduzir sua fatia na companhia de cerca de 60% para 45%.
Enviada em 23 de fevereiro, a proposta é uma das prioridades do Executivo e aposta do governo para ampliar os investimentos na empresa, maior companhia de energia elétrica da América Latina. A Câmara já tinha aprovado a MP no dia 20 de maio, e o Senado, no dia 17 de junho. Como os senadores modificaram o texto aprovado pelos deputados, ele precisava voltar para uma nova análise da Câmara.
Repleto de “jabutis” – como são chamadas as emendas estranhas à proposta original – incluídos tanto pelos deputados quanto por senadores, o texto vai aumentar o custo da energia para consumidores em R$ 84 bilhões nas próximas décadas. Por sua vez, o governo sustenta que a privatização da estatal e as medidas incluídas pelo Congresso podem reduzir a conta de luz em até 7,36%.
A MP da Eletrobrás foi a primeira proposta de privatização aprovada pelo Congresso aprovada durante a gestão de Bolsonaro. Até o momento, o governo não conseguiu vender nenhuma estatal de controle direto da União. Pelo contrário, criou uma nova, a NAV, responsável pela navegação aérea.
Embora seja um projeto caro para o Executivo, poucos deputados que integram a base do governo na Casa se manifestaram a favor do texto na discussão nesta segunda-feira. Coube ao líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), defender a proposta.
“Esta medida não aumenta o preço da energia elétrica. Isso é uma falácia. Pelo contrário, teremos mais investimento, mais geração de empregos, mais competência no sistema e, obviamente, teremos mais capacidade de atender, com a capitalização da Eletrobras, inúmeros locais onde hoje é difícil o acesso da energia. Esta medida provisória privilegia muito a Amazônia, local onde nós temos mais dificuldade de fornecimento”, afirmou Barros.
O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), também defendeu os jabutis incluídos no Congresso e afirmou que são relacionados ao tema da MP, que trata do setor elétrico. “Essa Casa tem que aprender a separar exatamente o que é que ela chama de jabuti para que a gente não jogue terra pra cima e ela caia nos olhos. Precisamos ter esse cuidado, essa Casa não é uma Casa carimbadora de medida provisória”, afirmou. “Se a MP vem falando de energia e a gente dizer que matéria pertinente com energia é jabuti, é depreciar o trabalho de deputados e deputadas que têm total respaldo para fazer quaisquer emendas que pensem que é meritória e o plenário decide por sua maioria.”
Assim como aconteceu na primeira votação na Câmara, deputados da oposição fizeram duras críticas à proposta. “Estamos hoje apreciando uma medida no momento em que está o Brasil a entrar em racionamento e apagão, vai faltar energia, e o governo está entregando a sua empresa de energia elétrica, a Eletrobrás. Se todo o Sistema Eletrobrás fosse reconstruído no Brasil, chegaria a R$ 400 bilhões”, afirmou o líder do PT, deputado Bohn Gass (RS).
O relator da MP na Câmara, Elmar Nascimento, manteve um trecho inconstitucional que foi fundamental para a obtenção dos votos dos três senadores de Roraima – Chico Rodrigues (DEM), Mecias de Jesus (Republicanos) e Telmário Mota (Pros). A emenda que atropela o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) no licenciamento para a construção da linha de transmissão de energia Manaus-Boa Vista.
Do total de 721 km do traçado previsto para ser erguido, 125 km passam dentro da terra indígena Waimiri Atroari, onde estão 31 aldeias e vivem 1.600 índios. Essa proposta pode ser considerada inconstitucional, já que é garantido na Constituição que as comunidades indígenas sejam consultadas sobre o tema, em atendimento a uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que garante esse direito.
Trechos excluídos
Em seu parecer apresentado nesta segunda, o deputado Elmar Nascimento retirou sete emendas propostas por senadores, que garantiram a aprovação da MP no Senado. Entre os trechos retirados estão as emendas que obrigavam a Eletronorte vender energia da hidrelétrica de Tucuruí a preços mais baixos para a indústria na região amazônica, e que o aumentava um subsídio embutido na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), para permitir a compra de uma permissionária de Santa Catarina por outra distribuidora.
Nascimento também rejeitou, a pedido do governo federal, a emenda que determinava indenização para o Estado do Piauí pela privatização de uma distribuidora federalizada há 20 anos. Em troca da renegociação de dívidas estaduais com a União, a empresa passou a pertencer à Eletrobras, foi privatizada em 2018.
O deputado ainda excluiu o trecho que detalhava a abertura do mercado livre para todos os consumidores até 2026. Segundo ele, o tema, incluído pelos senadores, foi mal recebido pelos deputados e será tratado no projeto de lei que trata do novo marco do setor elétrico, já aprovado no Senado e em tramitação na Câmara.
Veja neste link como votou cada deputado na MP da Eletrobrás no placar da Câmara dos Deputados.
Repercussão
O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, celebrou a aprovação da meedida provisória pelo Congresso. Segundo ele, o governo avalia que o texto final da proposta é positivo. “O protagonismo a respeito da MP, após o encaminhamento da MP pelo Executivo, é do Congresso”, afirmou.
Sobre os jabutis, que criaram a obrigação da contratação de 8 mil MW de termelétricas a gás, o ministro contemporizou e disse que elas já estavam previstas no planejamento do setor elétrico, ainda que não houvesse, no planejamento, nem definição do preço, nem dos locais em que elas serão construídas, como os parlamentares determinaram no texto final.
Segundo ele, o primeiro leilão de reserva de capacidade para contratação dessas termelétricas será realizado em dezembro. “No final, o consumidor será beneficiado”, insistiu o ministro.
Jabutis aprovados pelos senadores na MP da Eletrobrás no dia 17
- Térmicas a gás natural:
União terá de contratar 8 mil MW de usinas termoelétricas movidas a gás natural, mesmo em locais sem o insumo. Será necessário construir gasodutos, que podem onerar as contas de luz.
- Proinfa:
Prorrogação dos contratos das usinas no âmbito do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica. A crítica é que esse programa incentiva a contratação de fontes alternativas de energia, como a eólica, mas o preço pago pela energia dos projetos do Proinfa está acima do de mercado, gerando custo adicional para os consumidores, segundo os especialistas.
- PCHs:
Texto determina contratação mínima de 40% de Pequenas Centrais Hidrelétricas nos próximos leilões. As PCHs são pequenas usinas com potência de geração de energia de até 50 MW, com área total do reservatório de água igual ou inferior a três quilômetros quadrados. Essa exigência também gerará repasse de custos aos consumidores.
- Reservatórios:
Obriga o Executivo a estabelecer plano para recuperação dos reservatórios de hidrelétricas em 10 anos. A medida atende ao pleito do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que nos últimos dias manifestou incômodo com a intenção do governo de reduzir o nível do reservatório da hidrelétrica de Furnas, no sul de Minas Gerais, para priorizar o uso da água para energia elétrica.
- Linhão de Roraima:
Medida atropela Ibama e Funai para garantir que a União possa iniciar obras do Linhão Manaus-Boa Vista, que interligará Roraima ao Sistema Interligado Nacional.
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